GUERRA CIVIL EM SUDÃO DO SUL: CRISE HUMANITÁRIA E CRIMES DE GUERRA
Giovanna Lana
Sudão, país que se tornou independente do Reino Unido em 1956, passou por instabilidades políticas internas, quais confluíram para uma série de guerras civis ao longo dos anos, até que em fevereiro de 2011, as populações dos países votaram, em referendo, pela emancipação da região na porção meridional do país, criando um novo Estado, o Sudão do Sul. (CAMPOS, 2017) Porém, ao invés de resolver a situação, o novo país nasce com grandes desafios e graves problemas sociais, além de não conseguir entrar em consenso com Sudão acerca da fronteira, pois ambos disputavam a região. Em conseqüência, a longa guerra civil se transformou em um conflito internacional. Os dois territórios possuem divergências étnico-culturais, mas, a principal razão para a existência dos conflitos está centrada na disputa pelos recursos naturais, principalmente o petróleo. (CAMPOS, 2017)
Em 1983, com a ruptura da Paz de Addis Ababa, instalou-se o conflito entre o governo do Sudão e o Exército de Libertação do Povo do Sudão (SPLA), tendo como base questões religiosas, de poder e recursos. Além disso, havia a tentativa de se impor a Sharia (lei islâmica) no Sul do país e em redefinir as fronteiras do Sul(CAMPOS, 2017). Como oposição ao SPLA, o Movimento de Libertação do Povo do Sudão (SPLM) tinha por objetivo libertar a população do sul da opressão vinda de Cartum, capital sudanesa. Em conseqüência, a luta armada entre os dois grupos logo se iniciou, acarretando no início de uma guerra civil no país. (CAMPOS, 2017)
Em 1985, foi instaurado no Sudão, por meio de um golpe de Estado, um regime militar fundamentalista-islâmico que levou ao poder Hassan-al-Turabi e depois Omar Hassan al-Bashir, que ainda permanece como Presidente do país. O governo de Bashir realizou ações para uniformizar as culturas e religiões heterogêneas do Sudão, explorar regiões e povos marginalizados para enriquecimento próprio, além de manter o Sul isolado(CAMPOS, 2017)
De acordo com a ONU (2014) o conflito que perdura até hoje já ocasionou 10 mil mortes e mais de um milhão de refugiados, além de deixar mais metade de sua população de 12 milhões sem recursos básicos para sobrevivência, devido principalmente a falta de alimentos, criando a maior crise de refugiados da África desde o genocídio de 1994 em Ruanda.
Em 2013, uma disputa por poder dentro SPLM resultou numa luta dentro do Exército, em razão de questões não resolvidas na divisão do SPLA nos anos 1990 e da falta de integração de facções opositoras no Exército após a adesão ao CPA. Desde então, a região continua em constante conflito. (CAMPOS, 2017)
Desde o início da guerra civil, a ONU alega haver abusos de poder, como também, violações dos direitos humanos por ambas partes envolvidas. Diante da situação crítica que o país se encontrava, as Nações Unidas, entendem que devem intervir no país,em uma missão de manutenção de paz, a qual, ajudaria a estabelecer melhores condições para o desenvolvimento da região, a consolidação da paz, segurança. Com isso criaram a Missão das Nações Unidas na República do Sudão do Sul (MINUSS) em 2011 pelo Conselho de Segurança, por meio da Resolução 1996. (FREITAS; FRANCO; SILVA, 2015)
A operação MINUSS desenvolveu atividades e projetos, com o auxílio de organizações humanitárias, no intuito de tentr mitigar os efeitos da guerra civil. Com isso, a missão forneceu assistência médica a centenas de feridos, além de trabalhar para a atenuação de problemas infraestruturais sul-sudaneses.(CAMPOS, 2017)
Em abril de 2017, confrontos entre as partes continuaram a ocorrer e civis a serem atingidos, especialmente na cidade de Pajok. Em virtude desse cenário, a ONU classificou o Sudão do Sul como um dos quatro países (além do Iêmen, Síria, Iraque) de “Nível 3” (o maior nível) em emergência humanitária no mundo, sendo o único da África.
Entretanto, apesar de todo bom trabalho feito pela MINUSS, o país ainda se encontra em uma situação crítica. A Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, identificou, mais de 40 militares de alta patente por terem cometido crimes contra a humanidade, que podem assemelhar-se a crimes de Guerra. (ONU, 2018) Pode se entender como crimes de guerra o grupo de leis definidos pela Convenção de Genebra.
O artigo 147 da Quarta Convenção de Genebra define crimes de guerra como:
“Assassinatos intencionais, tortura e tratamento desumano, inclusive… causando grande sofrimento intencionalmente, ou graves danos ao corpo ou à saúde, deportações e deslocamentos ilegais, confinamentos ilegais de pessoas protegidas, obrigar pessoas a servir em forças hostis, privação intencional do direito a um julgamento justo e regular de pessoas protegidas, … fazer reféns, destruição extensiva e apropriação indevida, não justificada por necessidade militar e realizada de maneira injustificada, intencionalmente”. (KAFALA, 2001)
De acordo com a ONU (2018), as facções divergentes, assim como os grupos armados que apoiam as partes no conflito estão a atacar deliberadamente civis com base na sua identidade étnica e através de assassinatos, raptos, violação e violência sexual, bem como saques e destruição de aldeias. Há uma alta escala da fome e destruição infligida no. A demolição de infraestruturas aconteceu em um “nível industrial”, com mais de 180 mil casas e edifícios destruídos em apenas alguns meses de 2017. (ONU, 2018)
Em julho de 2018 presidente sudanês Omer al-Bashir prolongou a suspensão unilateral das hostilidades por um período de seis meses até o final do ano. (SUDAN TRIBUNE, 2018) Porém, em setembro do mesmo ano, a situação do país ainda se encontrava crítica, e os crimes contra a humanidade continuam constantes. De acordo com a Anistia Internacional, o governo sul Sudanês, juntamente de suas milícias aliadas, atacam civis, incluindo mulheres, crianças e idosos.(AL JAZEERA, 2018)
Testemunhas descreveram como soldados e combatentes atacaram esses civis. O relatório foi baseado em entrevistas com 100 pessoas deslocadas dos condados de Leer e Mayendit no Estado da Unidade, que estão entre as regiões mais duramente atingidas durante a guerra civil de cinco anos do Sudão do Sul. Os ataques continuaram por uma semana depois que um cessar-fogo foi anunciado. (AL JAZEERA, 2018) A liberdade de expressão é essencial para o Sudão do Sul, apenas assim a paz genuína e duradoura poderá ser alcançada no país. A conclusão consta de um relatório das Nações Unidas. É relatado também, no art 109 do relatório que as violações dos direitos humanos cometidas pelo SPLA e pelas forças controladas pelo governo dão origem à responsabilidade do Estado por parte do Sudão do Sul. O governo tem o dever de investigar e julgar esses crimes e de fornecer reparações às vítimas. (ONU, 2018)
Portanto, pode-se entender que a Guerra Civil no Sudão do Sul, além de seus problemas internos que causam a mesma, é agravada pelos crimes de guerra, tendo em vista que soldados não respeitam civis e agem como querem. É importante que o país tome medidas, junto a ajuda da ONU a população consiga estabelecer acordos de paz e para conter os crimes.
REFERÊNCIAS
CAMPOS, Lígia.O ATUAL CONFLITO NO SUDÃO DO SUL. Observatório de conflitos internacionais, 2 abr 2017. Disponível em: < https://www.marilia.unesp.br/Home/Extensao/observatoriodeconflitosinternacionais/serie—o-atual-conflito-no-sudao-do-sul.pdf> Acesso 27 out 2018
FREITAS, Gabriela; FRANCO, Geisa; SILVA, Iury. A Missão das Nações Unidas na República do Sudão do Sul (MINUSS): contribuições e limites. 5 mai 2015. Disponível em: < https://www.mundorama.net/?p=15826> Acesso 29 out 2018
KAFALA, TarikO que é um crime de guerra? BBC Brasil, 03 jul 2001 Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2001/010703_crimes.shtml> Acesso em 27 out 2018
KHARTOUM. Sudan renews adherence to unilateral ceasefire until end of year. SudanTribune 21 out 2018. Disponível em: < http://www.sudantribune.com/spip.php?article66474> Acesso 29 out 2018
ONU identifica crimes contra a humanidade cometidos por militares no Sudão do Sul. 23 FEV 2018. Disponível em: < https://nacoesunidas.org/onu-identifica-crimes-contra-a-humanidade-cometidos-por-militares-no-sudao-do-sul/> Acesso 28 out 2018
Rights group accuses South Sudan of ‘war crimes’ [S.l]: Al Jazeera, news, Africa, 19 sep. 2018. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/news/2018/09/rights-group-accuses-south-sudan-war-crimes-180919143625843.html> Acesso em 27 out 2018