Texto Conjuntural: Países Andinos #11

Assange: como a mudança do regime equatoriano influenciou no caso do jornalista.

Data: 15\05\2019

Isabela Belloni.

No dia 11 de abril de 2019,  Julian Assange, o fundador do site Wikileaks foi preso na embaixada do Equador em Londres, após quase sete anos de asilo. Por conta de seu trabalho como jornalista e seu papel como ativista com relação a liberdade de expressão, o periodista passou a ser considerado um criminoso virtual – principalmente pelos Estados Unidos. Buscando a melhor forma de evitar ser exilado da Inglaterra e, por consequência, ser julgado pelos seus atos nos países onde suas ações são constituídas como crime contra o governo, o jornalista viu no então regime do Equador uma forma de apoio.

Em 2007, Assange passou a divulgar diversos documentos e imagens confidenciais relacionados a grandes potências em seu site. Com o vazamento de vídeos, em 2010, em que soldados americanos matavam crianças e cidadãos inocentes durante a guerra do Iraque, os holofotes se voltaram para ele (BBC, 2019). Após a disseminação desses conteúdos, a situação política de Assange tornou-se complicada.

Com uma acusação de abuso sexual na Suécia, o jornalista passou a temer por sua extradição da Inglaterra. Com a possibilidade de precisar ir ao país responder por tal incriminação, existia a possibilidade de ocorrer uma transferência para os EUA, tendo como fim um julgamento e sua prisão pela ameaça resultante do vazamento – considerado ilegal no país – de documentos governamentais. Após seu acolhimento pela embaixada do Equador, as queixas suecas foram retiradas.

Em 2012, quando o caso começou a tomar grandes proporções meio ao cenário internacional, o governo equatoriano ainda era regido por Rafael Correa. O ex-presidente foi eleito em 2007 por conta de suas propostas focadas na melhoria do bem-estar socioeconômico do país – com enfoque em grupos minoritários – além de defender o resguardo dos recursos naturais do país. Sendo assim, durante seus seguintes dez anos de governo, Correa foi considerado um grande líder de interesses de esquerda. Ações tais como a criação Secretaria de Cidadania, Povos e Movimentos Sociais, que concretizou avanços significativos em pontos sociais do país com relação aos anos 90, acentuam sua preocupação com as minorias (MENON, GUSTAVO, 2012).

Esse título configura o porquê Assenge, considerado por seus apoiadores como um ousado defensor da verdade, foi acolhido pelo governo equatoriano na época. O ex-presidente com seus ideais antineoliberais seguiu princípios contrários a posicionamentos políticos e econômicos dos EUA durante o seu mandato, deixando esse ponto claro com a não renovação da base militar americana no território. Dessa maneira, a proteção do jornalista na embaixada do Equador pode ser vista tanto como uma forma de confrontar a potência norte-americana, como também de sustentar seus próprios ideais político-sociais – bem realçados desde o momento no qual assumiu a presidência com discursos e posturas que se opunham ao Banco Mundial e ao Fundo Internacional Monetário (FMI) (MENON, GUSTAVO, 2012).  Compreende-se então como o posicionamento de um governo de esquerda assegurou a defesa e reclusão de um homem considerado um exemplo na busca pela liberdade de expressão pelo mundo.

No entanto, essa situação reflete também diretamente na colocação de Rafael Correa com relação ao mercado e relações internacionais do país como um todo. Em 2017, após completar 10 anos de mandato, Correa passou o seu cargo para Lenín Moreno – que logo se rompeu dos interesses de seu até então aliado – e assim, Correa perdeu o direito de poder se candidatar à presidência novamente (EL PAÍS, 2018). Após uma década tendo como base a revolução socialista encorpada pelo ex-presidente, a centralização política do país passou a se tornar uma realidade mais próxima. Essa situação foi se tornando clara quando sucessor de Correa passou adotar medidas neoliberais e inverteu as políticas internas e externas do país .

Visando sanar a situação econômica do Equador, Lenín passou a frisar sua mudança de ponto de vista com relação ao antigo presidente a partir de mudanças como a eliminação e fusão de uma série de empresas públicas e ministérios do governo (EL COMÉRCIO, 2018). Além disso, os novos princípios do governo foram acentuados com a decisão de retirar-se da Aliança Bolivariana para Povos da Nossa América (ALBA) alegando descontentamento com a disposição de Nicolás Maduro de solucionar a atual crise. Essa decisão acabou enfraquecendo seus laços com Cuba e Venezuela. Sendo assim, o auxílio a Assange, que antes era considerada uma forma deliberada de bater de frente com as ideias e posicionamentos dos EUA e também foi uma maneira de Correa se reiterar de seus ideais sociais antes das eleições que renovariam seu cargo em 2013, se provou irrelevante para o novo governo que busca cada vez mais se aproximar do que o ex-presidente contrariava no âmbito internacional (DW, 2019).

Após o país reiterar seus laços com os Estados Unidos e com o FMI sob a nova regência, a decisão com relação a Julian Assange acaba soando como uma cartada final para cortar laços com as antigas convicções equatorianas. Nas palavras de Moreno após o pronunciamento público relacionado a derrogação do asilo de Assange “A paciência do Equador chegou ao seu limite”. A decisão de retirar o suporte ao jornalista chegou a mídia internacional como punição a rupturas de compromisso que o mesmo deveria seguir com relação as dependências em sua embaixada (EL PAÍS, 2019). Com a principal acusação de intervenção em objetos internacionais através de sua organização, a Ministra do Interior disse para o periódico EL PAIS que “a retirada do asilo é uma competência soberana do Equador e também é a consequência do descumprimento reiterado das normas de asilo e de mínima convivência”.

Portanto, levando em consideração que a proteção de Assenge tenha perdido seu sentido e conotação política nos últimos anos para o Equador, a forma na qual o refugio deixou de ser concedido englobou uma série de ataques cibernéticos e protestos no país  – mesmo com a maior parte dos equatorianos não possuindo conhecimento sobre a situação do jornalista como asilado. A prisão de Julian Assenge, mesmo anos após a situação de maior enfoque no cenário internacional, é configurada como uma forma de repressão a liberdade de expressão e, consequentemente, um ponto no qual o Equador será relacionado por conta de seu novo governo neoliberal.

Fontes:

ALJAZEERA. Jailed for journalism: wikileaks editor Hrafnsson on Assange case. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/&gt;. Acesso em: 17 abr. 2019.

BBC. Julian Assange: quem é o fundador do wikileaks, preso em londres após quase 7 anos de asilo em embaixada do equador. Disponível em: <https://www.bbc.com&gt;. Acesso em: 12 abr. 2019.

  1. O jogo de interesses entre Assange e o equador. Disponível em: <https://www.dw.com/&gt;. Acesso em: 14 abr. 2019.

EL COMERCIO. Una a una, las medidas económicas anunciadas por Lenín Moreno. Disponível em: <https://www.elcomercio.com/&gt;. Acesso em: 17 abr. 2019.

EL PAÍS. Assim o equador perdeu a paciência com Assange. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/&gt;. Acesso em: 15 abr. 2019.

EL PAÍS. Equador elimina a reeleição indefinida e põe fim à era do “socialismo do século xxi”. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/&gt;. Acesso em: 17 abr. 2019.

G1. Equador denuncia ataques cibernéticos após prisão de Assange. Disponível em: <https://g1.globo.com&gt;. Acesso em: 20 abr. 2019.

GRUPO ATLÂNTICO SUL. Texto conjuntural: países andinos #7. Disponível em: <https://grupoatlanticosul.com&gt;. Acesso em: 13 abr. 2019.

MENON, Gustavo. A Revolução Cidadã: o governo Rafael Correa e os movimentos sociais no Equador. REBELA – Revista Brasileira de Estudos Latino-Americanos, Florianópolis, v. 2, n. 1, p. 45-53, jun. 2012.

O GLOBO. Equador se retira da alba em meio a crise migratória da Venezuela. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/&gt;. Acesso em: 16 abr. 2019.

 

 

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