Texto Conjuntural: Chifre da África #3 – Deslocamento forçado – Sudão do Sul e a maior crise humanitária da atualidade.

Deslocamento forçado – Sudão do Sul e a maior crise humanitária da atualidade

Alice Ferreira

Iniciada no final de 2013, a crise de refugiados no Sudão do Sul se intensificou, e já neste ano de 2018, tende a se tornar a maior da atualidade, ultrapassando a da Síria. Os números são alarmantes como aponta dados do ACNUR (Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados) do ano de 2017, ultrapassando os milhões, além das lesões aos direitos humanos básicos dos civis, o que faz com que os indivíduos, em sua maioria mulheres e crianças, busquem abrigo nos países africanos vizinhos.

O país promulgou sua independência através de um referendo em 2011, e como um novo país separado do Sudão, surgiram também novos problemas e desafios para seu novo governante e sua população, como cita a autora Lígia Maria Campos (2017):

“Os desafios que nasceram com Sudão do Sul incluíram: extrema pobreza; dificuldade de controle do novo governo sobre o território; problemas na infraestrutura e na demarcação de fronteiras; um dos piores indicadores sociais do mundo; pouco saneamento básico e saúde; deficiente infraestrutura de transporte, comunicações e energia, entre outros. Destacam-se também problemas de segurança pública e a disputa por petróleo que acabou incluindo tanto atores internos quanto externos. ” (CAMPOS, p.2, 2017)

O real estopim do conflito, como conclui Campos (2017), se deu quando do rompimento das relações do presidente Salva Kiir Mayardit com seu vice Riek Machar, onde ambos atuavam pelo Exército de Libertação do Povo do Sudão (SPLA, em inglês). Já sem popularidade, e após um discurso de Kiir, iniciou-se um conflito entre as forças armadas do presidente e as dos militantes civis que defendiam Kiir que perdura até os dias de hoje.

Imagem 1: Soldados sul-sudaneses em campo de treinamento

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Fonte: AP Photo/ Jason Patinkin

 

De acordo com dados da ACNUR em 2016, o país já era um dos que gerava o maior número de refugiados, ao lado da Síria, Afeganistão e Somália, com números que ultrapassavam 1 milhão. Com o conflito chegando em seu quinto ano, em 2018 o número de sul sudaneses está estimado em elevar de 2,5 milhões de refugiados para 3 milhões, como afirma a ONU (Organizações das Nações Unidas), cujo principais destinos encontram-se na Uganda, Quênia, Sudão, Etiópia e República Democrática do Congo. Como aponta Nielsen (2017), a generosa política progressista da Uganda é fundamental, uma vez que aceita os refugiados e concede a eles o direito de trabalhar em seu território.

Imagem 2: Refugiados sul–sudaneses em busca de abrigo

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Fonte: Acnur/ Barb Wigley

Caracterizando-se como uma situação sem precedentes, não só os números que cresciam rapidamente preocupavam a comunidade mundial, como também a agressão aos direitos humanos, crimes bárbaros e a situação de miséria a que a população estava e está sujeita. Os refugiados relatam casos de horror presenciados por eles e vividos em suas comunidades, como assassinatos de crianças, queima de casas e aldeias inteiras, sequestros, meninos sendo recrutados à força. As mulheres e meninas sofrem mais uma vez por serem a maioria deste grupo marginalizado e por estarem desamparadas e despreparadas. Casos de estupros e violência sexual por parte das duas tropas perdem-se de vista, e o cenário é de violência generalizada e traumatizante para as próximas gerações. As crianças lutam contra a desnutrição ocasionada pela extrema miséria e fome, uma vez que para alcançar o destino de refúgio, na maioria das vezes são necessárias semanas ou meses de caminhadas intensas, nas quais muitos indivíduos não suportam o caminho. “Os Dinkas chegam de noite, cortam pessoas e crianças e atiram-nas ao rio”, conta uma refugiada de 26 anos (NIELSEN, 2017).

A falta de financiamento e de exposição desta crise humanitária e estrutural faz com que se torne cada vez mais difícil lidar com ela, também pela falta de estrutura e de preparo para os países africanos vizinhos receberem tamanho número de refugiados. No entanto, como cita Schmidt no artigo de Nielsen (2017), por comparação, países desenvolvidos da Europa impõem dificuldades e restrições ao acolherem imigrantes sírios, enquanto a Uganda, um país menos desenvolvido, já acolheu em torno de 1,2 milhão de pessoas de seu país vizinho. Outro ponto que cabe ressalva é a pequena quantidade de fundos concedidos para uma possível manutenção da crise, cerca de 33% da quantia estimada necessária segundo a ONU.

Imagem 3: Crianças refugiadas a espera de comida

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Fonte: James Akena/ Reuters

Dessa forma, faz-se necessário abordar esta crise de forma muito mais adequada, pois não compreende apenas o Sudão o Sul, abrange todo o entorno dos países africanos que recebem estes refugiados que fogem do conflito. Além disso, cabe à comunidade internacional ajudar os civis que pedem ajuda, visto que seus direitos humanos básicos estão sendo feridos.

REFERÊNCIAS
ACNUR. Deslocando-se Através das fronteiras. ACNUR- Agencia da ONU apara refugiados. [S.I]: ACNUR, 2016. Disponível em: <http://www.acnur.org/portugues/quem-ajudamos/refugiados/&gt;. Acesso em 3 out. 2017

ACNUR. Refugiados do Sudão do Sul em Uganda já são mais de 1 milhão. [S.I]: Agência Brasil, 2017. Disponível em: < http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2017-08/refugiados-do-sudao-do-sul-em-uganda-ja-sao-mais-de-1-milhao-alerta&gt; Acesso em: 15 maio. 2018.

ACNUR; WIGLEY, Barb. Já passa de 1 milhão o total de refugiados do Sudão do Sul. [S.I]: Onu News, 2016. Disponível em: < https://news.un.org/pt/story/2016/09/1563011-ja-passa-de-1-milhao-o-total-de-refugiados-do-sudao-do-sul&gt; Acesso em: 16 maio. 2018.
AKENA James; REUTERS. A cada três segundos uma pessoa é forçada a deixar o local onde vive. [S.I]: Manancial Web, 2017. Disponível em: < http://www.manancialweb.com/m/noticias/brasil/193801&gt; Acesso em: 16 maio. 2018.
AP Photo; PATINKIN, Jason. Número de refugiados no Sudão do Sul se aproxima de 1 milhão. [S.I]: Sputinik Brasil, 2016. Disponível em: < https://br.sputniknews.com/oriente_medio_africa/201608126024724-refugiados-sudao-sul/&gt; Acesso em: 16 maio. 2018.

CAMPOS, Ligia Maria Caldeira Leite. O Atual Conflito no Sudão do Sul. v.4, n.2, abr. 2017. Disponível em: <https://www.marilia.unesp.br/Home/Extensao/observatoriodeconflitosinternacionais/serie—o-atual-conflito-no-sudao-do-sul.pdf&gt; Acesso em: 15 maio. 2018.

NAÇÕES UNIDAS. Crise de refugiados do Sudão do Sul deve se tornar a maior do mundo este ano. [S.I]: ONU Brasil, 2018. Disponível em: < https://nacoesunidas.org/crise-de-refugiados-do-sudao-do-sul-deve-se-tornar-a-maior-do-mundo-este-ano-alerta-onu/&gt; Acesso em: 15 maio. 2018.

NAÇÕES UNIDAS. Crise de refugiados no Sudão do Sul é a que mais cresce no mundo. [S.I]: ONU Brasil, 2017. Disponível em: < https://nacoesunidas.org/crise-de-refugiados-no-sudao-do-sul-e-a-que-mais-cresce-no-mundo/&gt; Acesso em 15 maio. 2018.

NIELSEN, Nikolaj. A maior crise de refugiados em África é no Sudão do Sul. [S.I]: Público PT, 2017. Disponível em: < https://www.publico.pt/2017/05/25/mundo/noticia/a-maior-crise-de-refugiados-em-africa-e-no-sudao-do-sul-1773297&gt; Acesso em: 15 maio. 2018.

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