
As compensações coloniais no continente africano: o caso do Burundi
Por: Bruna Castro
O passado colonial dos países africanos têm influenciado grande parte de suas atuais políticas. Em especial, a violência contra as populações africanas colonizadas criaram estragos geracionais, sendo portanto levantada a pauta da compensação financeira pelos crimes cometidos pelas potências europeias durante este período.
Desde 2015, por exemplo, a Namíbia negocia com a Alemanha termos de reparações pelos efeitos de sua colonização, notadamente pelo genocídio dos grupos étnicos Herero e Nama. Entre 1904 e 1908, cerca de 50-70% de Hereros e 30% de Namas foram mortos (MELBER; KÖSSLER, 2018). Além disso, neste período, milhares de pessoas Herero e Nama foram confinados a campos de concentração, onde muitos morreram de fome e desnutrição, doenças e as consequências de trabalho forçado. Em decorrência disto, além da solicitação de um pedido de desculpas formal pelo governo alemão, o governo namibiano demandou uma compensação financeira pela violência cometida pela Alemanha contra seus cidadãos (MELBER; KÖSSLER, 2018).
Inspirado na mobilização inicial da Namíbia, o Burundi então exigiu o mesmo de seus colonizadores, a Alemanha e a Bélgica. Como demais países africanos, uma parcela dos problemas no Burundi foram causados pelas tensões étnicas agravadas pelas divisões estabelecidas por seus colonizadores. Com base em uma avaliação dos danos econômicos sofridos pelo país durante sua colonização, o governo do Burundi preparou então sua queixa formal (PARELLADA, 2020). No caso do Burundi, percebe-se que muitas de suas dificuldades políticas advinham da política de divisão étnica estabelecida pelo Rei Alberto I da Bélgica, com o decreto de 1931, que acirrou mais as tensões entre as diversas etnias na região (BURUNDI…, 2020).
De acordo com Aloys Batungwanayo, um historiador e pesquisador na Universidade de Lausanne, na Suíça, seria esta política que “(…) gerou conflitos no Burundi e na região, visto que parte da população foi excluída da classe dominante (…)” (BURUNDI…, 2020, s.p., tradução nossa)¹. Em especial, esta política é “(…) considerada a semente dos massacres e da guerra civil (1993-2005) que assolaram Burundi depois da sua independência, em 1962” (PARELLADA, 2020, s.p.). Assim, o governo do Burundi exigiu também, além de um pedido de desculpas formal, uma compensação pela violência advinda de sua colonização. A estimativa de compensação financeira a ser exigida da Alemanha e da Bélgica é de EUR 36 bilhões (CASCAIS, 2020). O Burundi também exigiu a devolução de artefatos roubados durante a colonização (PARELLADA, 2020)..
Não obstante, enquanto as demandas por responsabilização pelos danos causados com a colonização aumentaram, os países colonizadores evitam assumir suas ações passadas e propõem soluções mais superficiais (PARELLADA, 2020). Em relação às demandas por responsabilidade com as colônias, apenas um caso resultou em indenização: a do Reino Unido, que somente compensou o povo Mau-Mau, do Quênia, após uma ordem judicial (PARELLADA, 2020). Em comparação, processos semelhantes iniciados pelo Senegal, pela Líbia e pela República Democrática do Congo resultaram em apenas gestos simbólicos, por meio de pedidos de desculpas e a devolução de alguns objetos roubados (PARELLADA, 2020; BURUNDI…, 2020; NEUENDORF, 2018;).
No caso do Burundi, não houve nenhum progresso em suas negociações com a Alemanha e a Bélgica desde que foi anunciado em agosto de 2020. Todavia, como demonstrado em processos semelhantes, as chances da demanda do país avançar para as negociações acerca de uma possível compensação financeira são baixas, sendo a solução mais viável para as potências europeias o reconhecimento de erros passados e o pedido formal de desculpas.
¹ (…) that has led to conflicts in Burundi and the region because some of the population was excluded from the ruling class (…).
Referências Bibliográficas
BURUNDI Joins Congo in Demanding Reparations from Belgium. Bloomberg News, [S. l.], 2020. Disponível em: <https://www.bloomberg.com/news/articles/2020-08-14/burundi-demands-43-billion-as-reparations-from-colonial-rulers>. Acesso em: 14 dez. 2020.
CASCAIS, Antônio. Crimes coloniais: Burundi poderá exigir 36 mil milhões de euros de Alemanha e Bélgica. Deutsche Welle, [S. l.], 2020. Disponível em: <https://www.dw.com/pt-002/crimes-coloniais-burundi-poder%C3%A1-exigir-36-mil-milh%C3%B5es-de-euros-de-alemanha-e-b%C3%A9lgica/a-54724353>. Acesso em: 14 dez. 2020.
PARELLADA, Gemma. Europa reluta em indenizar a África pela colonização. El País, Cidade do Cabo, 2020. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/internacional/2020-09-07/a-europa-reluta-em-indenizar-a-africa-pela-colonizacao.html>. Acesso em: 14 dez. 2020.
MELBER, Henning; KÖSSLER, Reinhart. Genocide negotiations between Germany and Namibia hit stumbling blocks. The Conversation, [S. l.], 2018. Disponível em: <https://theconversation.com/genocide-negotiations-between-germany-and-namibia-hit-stumbling-blocks-89697>. Acesso em: 16 dez. 2020.
NEUENDORF, Henri. Senegal and the Ivory Coast Ask France to Return Looted Art in the Wake of a Groundbreaking Restitution Report. Art News, [S. l.], 2018. Disponível em: <https://news.artnet.com/art-world/senegal-ivory-coast-france-repatriation-1405822>. Acesso em: 16 dez. 2020.