Nigéria em disputa: os embates de China e Japão em busca de influência no território.
Matheus Henrique dos Santos Mapa.
O continente africano vê-se alvo de uma assídua disputa entre as potências econômicas globais, devido à grande disponibilidade e variedade de recursos naturais presentes em seu território. Petróleo, gás natural, ouro, diamantes: a lista de commodities produzidas na África é vasta e valiosa, o que direciona a atenção dos países desenvolvidos diretamente para tais recursos. Diante disso, a Nigéria apresenta-se como um país com abundância de petróleo, o que naturalmente levou a um cenário de embate entre as potências econômicas para assegurar o acesso a esse recurso.
A China, em sua empreitada para alcançar o posto de potência global, evidencia a sua crescente necessidade de petróleo, cuja presença é essencial para sustentar a industrialização maciça do país, que exponencialmente ganha espaço nos setores automobilístico e eletroeletrônico internacionais. Em contrapartida, o Japão, com um histórico de destaque nos setores industriais supracitados, também busca com urgência o acesso ao petróleo, visto que, sendo um país insular, o país vê-se em uma situação delicada no que diz respeito à garantia de reservas petrolíferas.
Mapa de recursos naturais nos países africanos, destacados por abundância
Nesse mesmo sentido, a batalha por uma esfera de influência no sudeste asiático entre China e Japão se consolida ao manifestar-se nesta disputa específica por petróleo no território nigeriano. O país está localizado na África Ocidental e compartilha fronteiras terrestres com a República do Benim a oeste; com Chade e Camarões a leste e com o Níger ao norte. Sua costa encontra-se ao sul, no Golfo da Guiné*, no Oceano Atlântico. Em uma autêntica corrida industrial, em que ambos atores lutam para alçarem vôos maiores e manterem suas posições de destaque, o desenrolar dos esforços chineses e japoneses na Nigéria faz-se de fundamental compreensão e análise.
AS PRESENÇAS CHINESA E JAPONESA EM TERRITÓRIO NIGERIANO: UM PANORAMA INICIAL
As relações diplomáticas entre Japão e Nigéria iniciaram-se no ano de 1960, quando a nação japonesa reconheceu a independência nigeriana, resultando em décadas de duradouros intercâmbios culturais. No que se refere às interações econômicas, especificamente no âmbito de importações e exportações, a típica relação do sul global subdesenvolvido com o norte global desenvolvido se faz presente. A exemplo do ano de 2020, as exportações nigerianas para o Japão consistiram em grandes quantidades de matérias-primas, como gás natural e alumínio, enquanto suas respectivas importações foram de bens industrializados e insumos manufaturados intermediariamente, como veículos, aço e fibra sintética (Ministry of Foreign Affairs of Japan, 2020).
No que diz respeito à presença chinesa em território nigeriano, tem-se o seu início pouco mais de uma década após a chegada dos japoneses, no ano de 1971. Entretanto, este aspecto não é de forma alguma algo deletério ao relacionamento dos dois países, que possui um histórico marcadamente frutífero, com a China ocupando a primeira posição no ranqueamento de parceiros comerciais da Nigéria nos anos de 2018 e 2019 (Observatory of Economic Complexity). Nesse mesmo sentido, no ano de 2020, as exportações chinesas para a Nigéria foram notadamente de produtos eletroeletrônicos e maquinário, o que é relevante característica da indústria chinesa no âmbito internacional.
O investimento chinês no petróleo nigeriano é maciço, atingindo $16 bi em 2019. Fonte: Voa News. 28/08/2019.
A princípio, a China sai na frente na corrida por influência na Nigéria, pois apresenta maior presença nas importações e exportações, bem como na visão positiva que o povo nigeriano possui das interações com o país. O Japão, no entanto, não se encontra muito aquém da capacidade de sua rival, ocupando também as primeiras posições nos ranqueamentos de relações comerciais com os nigerianos, apesar de sua influência para além do meio econômico ser limitada.
NIGÉRIA E CHINA: DO EQUILÍBRIO À DEPENDÊNCIA
Como evidenciado anteriormente, a China ocupa uma posição estratégica e significativa nas relações com a Nigéria, em especial no quesito comercial. Mantendo-se, por consequência, na frente dos japoneses em investimentos gerais no território nigeriano. Entretanto, apesar da existência dessa produtiva relação sino-nigeriana vir sendo benéfica para o desenvolvimento do país africano, algumas fragilidades entre as duas nações, no que se refere a pautas sociais e geopolíticas, começam a se tornar cada vez mais relevantes, o que pode ser a oportunidade perfeita para uma maior presença japonesa no território.
O Presidente da China, Xi Jinping, e o Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, cumprimentam-se em Pequim. Foto: Kenzaburo Fukuhara, 2016.
Nesse sentido, a problemática envolvendo a presença chinesa na Nigéria também se estende para grande parte do continente, devido à crescente presença do país na África. Vendo traços colonialistas na empreitada chinesa no continente africano, o professor Adagbo Onoja, da Universidade Católica da Nigéria, aponta os riscos de uma hegemonia chinesa travestida de missão altruísta para o desenvolvimento do continente (The Diplomat, 2020). Doravante, a crescente instalação de empresas chinesas para o estabelecimento de infraestrutura de transporte, alojamento e telecomunicações também demonstra um cenário de possível dependência nigeriana para com os chineses, tendo em vista a predominância destas mesmas empresas em tais áreas essenciais à vida contemporânea.
A ALTERNATIVA JAPONESA
Tendo em vista um possível cenário de dependência dos nigerianos, à medida que a predominância da indústria e investimento dos chineses aumenta maciçamente, o Japão apresenta-se como uma alternativa para um desenvolvimento equilibrado do país, possibilitando uma relação mais harmoniosa com o capital externo.
A exemplo do receio de domínio chinês no setor de transportes, o Japão pode encontrar um mercado fértil para a venda e montagem de veículos na Nigéria, aproveitando-se da já próspera relação comercial que os dois países possuem, marcados pela expressiva importação de veículos por parte dos nigerianos. Com uma das maiores indústrias automobilísticas do mundo, uma maior presença dos japoneses neste setor auxiliaria a Nigéria, permitindo uma negociação mais ampla.
O então primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, com o presidente nigeriano Muhammadu Buhari, em encontro na cidade de Yokohama. (Foto: Cabinet Public Relations Office, 2019)
Além disso, o setor dos eletroeletrônicos encontra-se em uma posição privilegiada quando o assunto é concorrência. Certamente haveria um cenário fértil de competição entre chineses e japoneses no âmbito dos eletrônicos, sendo estes grandes produtores de tecnologias do setor. Esta entrada de capital estrangeiro no território nigeriano, portanto, permitiria um maior acesso da população a eletroeletrônicos asiáticos, ao passo que mais empregos seriam gerados com a fundação de filiais destas multinacionais na Nigéria.
Por isso, no ponto de vista do equilíbrio no comércio interior dos nigerianos, um cenário de maior comercialização com o Japão em setores estratégicos (e outras potências globais) auxiliaria na quebra do domínio chinês no território, reduzindo esta situação de possível dependência.
CONCORRÊNCIA E COMÉRCIO MULTILATERAL: UM CAMINHO PARA A NIGÉRIA
Desta forma, a Nigéria, manifestando-se como um país rico em recursos naturais e commodities, desperta cada vez mais o interesse das potências do norte global, em especial os supracitados China e Japão. Exportando matéria-prima e importando produtos mais complexos, que passaram por um processo de industrialização, os nigerianos encontram-se no clássico cenário do comércio exterior do mundo subdesenvolvido com o desenvolvido.
Ademais, com a crescente posição dos chineses na porcentagem de importação e investimento no território nigeriano, preocupações no âmbito da dependência e da exploração predatória da Nigéria mostram-se pertinentes. Deste modo, uma maior presença de capital japonês, investindo diretamente em território nigeriano, permitiria uma situação comercial mais saudável para o país africano, diminuindo o peso de sua dívida externa com os chineses, evitando uma posição de fragilidade e impotência perante esta potência.
Referências Bibliográficas
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Trading Economics. CHINA exports to Nigeria. Disponível em: https://tradingeconomics.com/china/exports/nigeria. Acesso em: 27 maio 2021.
*Observação: O país Nigéria pertence ao grupo de estudos do GAS Golfo da Guiné.