Texto Conjuntural: África Austral #14

Os ataques terroristas em Cabo Delgado – Moçambique

Augusto Rodrigues Azalim

Moçambique é uma nação localizada na África Austral, ao sul do continente, e é um dos países lusófonos, os quais compartilham a língua e os costumes portugueses. Em meados de 2017, na província de Cabo Delgado, houve relatos de um ataque armado contra instituições governamentais e particulares, como casas e comércios.  O grupo responsável por este ataque foi o denominado Al Shabaab. De acordo com o relatório de 2021 da Amnesty International, em 2018 algumas fotos foram disponibilizadas em redes sociais de combatentes do grupo terrorista Al Shabaab declarando fidelidade ao também grupo terrorista Estado Islâmico. Desde então, os ataques continuam, até mesmo, durante a pandemia da Covid-19. Sendo, Palma, um distrito de Cabo Delgado, dentre os locais mais atingidos com os ataques terroristas neste ano. Diante disso, a presente pesquisa visa relatar os problemas sofridos pela população de Cabo Delgado, visto que a situação na região ao norte de Moçambique é pouco difundida e consequentemente pouco conhecida no Brasil.

Cabo Delgado, a província mais a norte de Moçambique, fica localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância de Maputo, capital do país, e encontra-se tão ao norte do país moçambicano que recebeu o apelido de “Cabo Esquecido”. Segundo o site do governo, a província de Cabo Delgado é composta por 17 distritos, que são eles: Ancuabe, Balama, Chiúre, Ibo, Macomia, Mecúfi, Meluco, Metuge, Mocímboa da Praia, Montepuez, Mueda, Muidumbe, Namuno, Nangade, Palma, Pemba, Quissanga. Além disso, Cabo Delgado é conhecida devido à extração de suas riquezas naturais, como rubis e gás natural. Ainda em concordância com o relatório da Amnesty International (2021), estas riquezas atraíram grandes corporações internacionais, tais como a Gemfields do Reino Unido, a Total da França e a Eni da Itália.

Fonte: Augusto R. Azalim

Atualmente o grupo rebelde, Ansar al-Sunna, está amedrontando tanto moradores da região, quanto os governantes do país. Talvez cause estranheza o nome do grupo terrorista acima, contudo, a população de Cabo Delgado chamam eles de Al Shabaab, que em uma tradução livre do árabe, significa “os jovens”.  Segundo Habibe, Forquilha e Pereira (2019), o grupo atacou instituições do governo de Moçambique na vila de Mocímboa da Praia, no dia 5 de outubro de 2017. Ainda segundo os autores, os mesmos surgiram na zona norte de Cabo Delgado, primeiro, como um grupo religioso e, em 2015, incorporou células militares. Os seus atos terroristas correspondem ao fundamentalismo religioso de combate à influência ocidental e de implantação radical da lei islâmica. Conforme o documento da Amnesty International (2021), o grupo não possuía força até a chegada das gigantescas mineradoras, que retiravam as riquezas naturais do local sem o recebimento de grandes benefícios por parte da comunidade.

Já em 2018 o Al Shabaab expressou fidelidade ao grupo terrorista Estado Islâmico (ISIS), ao postarem imagens em redes sociais de integrantes junto aos integrantes do ISIS. É válido citar que o ISIS  ganhou projeção em 2014 com a guerra civil síria, proclamando a criação de um califado, um modelo de governo árabe (SOARES, 2018). A partir disso, o principal objetivo do Estado Islâmico era expandir mais e mais este califado, no entanto, apenas em junho de 2019 eles confirmaram o compromisso de fidelidade do grupo moçambicano.

Como forças opositoras do grupo Al Shabaab, a província conta com o auxílio das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) e a Unidade de Intervenção Rápida (UIR), ambas governamentais. Aliada à Dyck Advisory Group (DAG), que é uma empresa militar privada da África do Sul (AMNESTY INTERNATIONAL, 2021). Não obstante, os ataques não cessaram desde outubro de 2017 quando começaram as ações do Al Shabaab. No entanto, em 2020, mais especificamente no dia 24 de março, o Estado Islâmico reivindicou a autoria de mais um ataque em Mocímboa da Praia. Os ataques terroristas continuaram no dia 8 e 20 de agosto e, também, no dia 8 de setembro. No dia 6 de novembro de 2020, terroristas atacaram as aldeias de Nanjaba e Muatide, ambas em Cabo Delgado.

Segundo reportagem do jornal “Observador”, foram efetuados disparos contra cidadãos e um campo de futebol próximo foi transformado em uma cena de terror, já que as pessoas decapitadas foram levadas para lá. Em seguida, no dia 24 de março de 2021, os ataques foram feitos contra a população de Palma, a qual foi atacada com ações de decapitação de várias pessoas. Isso originou o deslocamento da população para outros locais, além da evacuação dos funcionários da empresa Total (ESTADO DE MINAS, 2021).

Fonte: Augusto R. Azalim

Os ataques terroristas contínuos contra a província de Cabo Delgado têm trazido inúmeros malefícios, como a morte de mais de 1300 civis e mais de 500 mil refugiados (AMNESTY INTERNATIONAL, 2021). Vizinhos de Moçambique, como África do Sul, Zimbábue e Tanzânia estão preocupados, e este último já registra incidentes parecidos em seu território, segundo reportagem da revista Planeta (2021). O governo moçambicano não parece conseguir lidar com o grupo rebelde, já que os ataques estão cada vez mais constantes e mais violentos. Além disso, os atos terroristas afetam a economia de Moçambique, tendo em vista a retirada dos funcionários da empresa francesa Total. Dessa forma, quem mais sofre são os habitantes de Cabo Delgado, que acabam sendo esquecidos, assim como o triste apelido da província.

REFERÊNCIAS

GEOGRAFIA: Divisão administrativa. [S. l.], 1 jan. 2017. Disponível em: https://www.cabodelgado.gov.mz/por/A-Provincia/Geografia. Acesso em: 19 maio 2021.

GRUPO do Estado Islâmico decapitou mais de 50 pessoas em Moçambique. Observador, [S. l.], p. 1, 10 nov. 2020. Disponível em: https://observador.pt/2020/11/10/grupo-islamico-decapitou-mais-de-50-pessoas-em-mocambique/. Acesso em: 20 maio 2021.

HABIBE, Saide; FORQUILHA, Salvador; PEREIRA, João. Radicalização Islâmica no Norte de Moçambique: O Caso de Mocímboa da Praia. Cadernos IESE, [s. l.], n. 17, 1 set. 2019. Disponível em: https://www.iese.ac.mz/wp-content/uploads/2019/09/cadernos_17.pdf. Acesso em: 19 maio 2021.

O que vi foi a morte: crimes de guerra no “Cabo esquecido” de Moçambique. Amnesty International, [S. l.], p. 1-44, 1 mar. 2021. Disponível em: https://www.amnesty.org/download/Documents/AFR4135452021PORTUGUESE.PDF. Acesso em: 19 maio 2021.

SOARES, João Victor Scomparim. A Guerra Civil na Síria:: atores, interesses e desdobramentos. Observatório de Conflitos Internacionais, [S. l.], v. 5, n. 1, p. 1-8, 1 fev. 2018. Disponível em: https://www.marilia.unesp.br/Home/Extensao/observatoriodeconflitosinternacionais/serie—a-guerra-civil-na-siria—atores-interesses-e-desdobramentos.pdf. Acesso em: 8 mar. 2021.

TOTAL suspende contratos de sua usina de gás em Moçambique. Estado de Minas, [S. l.], p. 1, 24 abr. 2021. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2021/04/20/interna_internacional,1259043/total-suspende-contratos-de-sua-usina-de-gas-em-mocambique.shtml. Acesso em: 24 abr. 2021.

VIOLÊNCIA extremista em Moçambique ameaça vizinhos. Planeta, [S. l.], p. 1, 30 mar. 2021. Disponível em: https://www.revistaplaneta.com.br/violencia-extremista-em-mocambique-ameaca-vizinhos/. Acesso em: 30 mar. 2021.

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