Guilherme Souza Rocha
Introdução
Em 2020, os países do globo se viram ameaçados por uma nova pandemia, gerada pela Covid-19. Esse cenário teve como consequência prejuízos à economia dos países, que tiveram que, primeiramente, diminuir ou paralisar atividades econômicas para conter a proliferação do vírus. Nesse cenário pandêmico, países denominados subdesenvolvidos sofrem maiores reflexos econômicos em consequência da pandemia, segundo exposto na Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (PLADSON, 2020). Além disso, questões como queda de renda da população e o aumento do desemprego, gerando o pior desempenho econômico em 30 anos desses países, UNCTAD (2020) alertou para consequências fora do aspecto econômico dado pela pandemia, como crises em sistemas de saúde e de educação da população (PLADSON, 2020).
Nesse sentido, o Zimbábue, país que vivenciou, nos últimos anos, uma crise econômica gravíssima, que atingiu níveis econômicos negativos alarmantes (MUSVANHIRI, 2018), vivencia o agravamento da conjuntura econômica devido à pandemia, trazendo, assim, consequências à sua população. Dito isso, este trabalho visa analisar as mudanças econômicas do Zimbábue, agravada pela pelo covid-19.
Impactos da Covid-19 no Zimbábue
O Zimbábue é um país localizado no Sul da África que, como a maioria dos países do continente africano, conquistou sua independência tardiamente. Colonizado primeiramente por portugueses e posteriormente por ingleses, o país foi foco de exploração europeia durante quase toda sua história. Seu território é fonte de riquezas naturais e possui um solo extremamente fertil, tendo a agropecuária, indústria e a mineração como principais atividade econômica e fontes de renda (FRANCISCO, 2010).
Antes da pandemia, a economia do Zimbábue já vivenciava um período extremamente turbulento. Em meados dos anos 2000, apenas 20 anos depois de sua independência, uma série de sanções econômicas advindas do Reino Unido e de bancos internacionais, como resposta à medidas econômicas de divisão de terras agrícolas, foram impostas, e o país se viu sem apoio externo que, apoiado por terem uma economia recente, assolou o país em uma crise financeira de anos, dificultando-os em relações econômicas com outros países. Além disso, prejudicou as principais fontes de renda da população, focada em agronegócio, que sem investimentos, viram as terras se tornarem improdutivas. Somado a isso, o governo anti democrático de Zimbábue se manteve no poder, mesmo com a economia atingindo números econômicos negativos, o que mantinha essa exclusão do internacional reforçada pela pouca diplomacia (BRANCO, 2008).

Em um novo cenário para a economia global, a pandemia apenas reforçou os problemas que já eram pauta para o povo e governo zimbabueano. O país tem como um dos principais parceiros econômicos e políticos a China, primeiro país a registrar casos da Covid-19. No início da pandemia, viagens à China foram restringidas para quebrar a corrente de transmissão do vírus (ZHU, PRASHAD, XIAOJUN, 2020), fazendo com que muitos comerciantes do Zimbábue perdessem sua fonte de renda, pautada em viagens à China para compra de produtos que seriam revendidos em seu país (NYONI, 2020). Além disso, o investimento do país asiático no Zimbábue também era em áreas de desenvolvimento nacional: a China era o principal apoiador financeiro de reformas em indústrias, usinas e outros projetos, em parceria com Governo zimbabueano, que iriam contribuir fortemente para o avanço da indústria no território, trazendo, assim benefícios financeiros (MHLANGA, 2020). No início da pandemia, na perspectiva de queda financeira, a China paralisou esses investimentos, que prejudicou ainda mais o Zimbábue e seu projeto desenvolvimentista (NYONI, 2020).
Impactos na própria indústria chinesa também foram sentidos no Zimbábue: com a paralisação inicial geral na China, a produção foi suspensa e, consequentemente, a exportação de bens foi restrita (G1, 2020 (?)), gerando falhas na entrega de commodities ao Zimbábue. Essa situação se assemelha com a relação do país com a África do Sul, maior recebedor de importações e o que mais exporta ao Zimbábue, entre bens do setor primário e secundário (INDEX MUNDI, 2017). Assim como em grande parte dos países africanos, a pandemia causou diversos prejuízos à economia, atrasando a continuidade dessas relações econômicas, tendo em vista que as nações, em sua maioria, possuem um alto número de trabalhadores informais, incluindo o Zimbábue, dificultando o bom funcionamento de medidas de controle de população para restringir a disseminação da doença (UGARTE, 2020).
Além disso, o Zimbábue utiliza o dólar americano como moeda oficial, tendo que lidar com variações e mudanças econômicas principalmente advindas dos Estados Unidos. Tendo isso em vista, durante a pandemia, o dólar sofreu inúmeras variações cambiais que geraram uma desvalorização em relação às principais moedas do mundo, afetando diretamente a economia zimbabueana e seus negócios (BARRÍA, 2021).
Essas questões levantadas demonstram a fragilidade da economia zimbabueana, sem auto sustentabilidade decorrente da dependência em relações com outros países, provado pelo seu baixo Produto Interno Bruto (PIB), que, em 2019, era de 17,216 milhões de dólares (COUNTRYECONOMY, 2019), e a inflação, apesar de um decrescimento nos últimos anos ainda está em 161% em 2021 (TRADING ECONOMICS, 2021), de acordo com dados advindos do próprio governo do país. Esses problemas econômicos geram reflexos ao bem-estar e prestação de serviços à população que, durante a pandemia, tem que lidar com um sistema de saúde precário. Somando o setor público e privado no combate à pandemia, o país tinha apenas 89 ventiladores e 1049 leitos em hospitais destinados ao tratamento da Covid-19, que atendem uma população de 15 milhões de pessoas (DZIRUTWE, 2021), de acordo com o Ministério da Saúde zimbabueano.
De acordo com medidas tiradas pelo Índice Gini, sistema que, de acordo com o Banco Mundial (2019), mede a taxa de desigualdade social de um país de acordo com uma série de fatores socioeconômicos, o Zimbábue apresentou, em 2019, uma taxa de 50,3. Isso evidencia que, além de mais da metade da população zimbabueana viver em níveis de pobreza (RODGERS, 2017), a distribuição de renda é extremamente desigual. No contexto pandêmico, a elite do país perdeu o privilégio de sair do país para utilizar de um sistema de saúde com melhor qualidade no exterior em decorrência de barreiras sanitárias impostas para a contenção do vírus, algo que era comum, principalmente aos políticos zimbabueanos. Isso evidenciou ainda mais, para toda a população rica e pobre do país, que o sistema de saúde é precário e está colapsando pela pandemia, sendo inconcebível atender toda a população de maneira adequada (DZIRUTWE, 2021).
No início de 2021, os casos de Covid-19 aumentaram drasticamente no Zimbábue, devido, principalmente, ao afrouxamento de medidas sanitárias, tal qual impedimento em viagens internacionais (MSF, 2021). Isso gerou uma demanda altíssima por vagas em hospitais do país, que não podem ser atendidas pelo baixo preparo do sistema de saúde, fazendo com que pacientes ficassem sem atendimento médico, mesmo com risco de morte pela doença (MSF, 2021). Somado a isso, uma das mais mortais e contagiosas variáveis da Covid-19 é a surgida na África do Sul (O TEMPO, 2021), e, por serem países vizinhos, o fluxo turístico e migratório desse país com Zimbábue é enorme, podendo influenciar na piora da pandemia entre a população zimbabueana. (MSF, 2021)
Conclusão
Os fatores acima explicam parcialmente como a pandemia da Covid-19 está sendo prejudicial ao Zimbábue, e o quanto continuará trazendo consequências adversas por longos anos, ao atrasar o desenvolvimento do país. A presente situação apenas impulsionou a crise política, humanitária e econômica que o país vinha vivenciando desde o ano de 2000 devido a uma série de fatores que, retomando a previsão da UNCTAD (2020), trará péssimas consequências pelos próximos 30 anos. A nova crise evidenciou, também, o quanto o Zimbábue é dependente da cooperação externa, tanto no setor econômico quanto em seu desenvolvimento de infraestrutura. A população pobre do Zimbábue é a que mais sofre com as consequências, tendo em vista que dependem exclusivamente do apoio público. Caso a previsão da UNCTAD (2020) se concretize, a população poderá ter seus péssimos índices (RODGERS, 2O17) de bem-estar humano piorados, prejudicando ainda mais o desenvolvimento nacional.
REFERÊNCIAS
BARRÍA, Cecília. ‘A queda do dólar está só começando‘: o impacto da pandemia sobre a moeda americana. BBC News, p. 1, 8 fev. 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-55980145. Acesso em: 11 jun. 2021.
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DZIRUTWE, MacDonald. Com os hospitais de todo o mundo inundados, a elite do Zimbabwe descobriu que a covid-19 mata ricos e pobres: Não há camas, os enfermeiras usam a mesma máscara durante os turnos de 12 horas, não há ventiladores. O sistema de saúde pública colapsou há muito. Mas as autoridades dizem que os nossos hospitais estão “preparados” e que a aposta é a prevenção.. Público, Harare, 29 jan. 2021. Coronavírus, p. 1. Disponível em: https://www.publico.pt/2021/01/29/mundo/noticia/hospitais-mundo-inundados-elite-zimbabwe-descobriu-covid19-mata-ricos-pobres-1948479. Acesso em: 10 jun. 2021
FRANCE PRESS (França). Com economia paralisada, produção industrial da China registra 1ª contração em quase 30 anos: Nos primeiros dois meses do ano, queda em ritmo anual foi de 13,5%, contra uma alta de 6,9% em dezembro. Já as vendas no varejo recuaram 20,5%.. G1, [S. l.], 16 mar. 2020. Economia, p. 1. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/03/16/com-economia-paralisada-producao-industrial-da-china-registra-1a-contracao-em-quase-30-anos.ghtml. Acesso em: 10 jun. 2021.
FRANCISCO, Wagner de Cerqueira e. “Zimbábue”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/zimbabue.html. Acesso em 11 de junho de 2021
MUGNOL UGARTE, Luiza. Como está o continente africano nesta pandemia da COVID-19?. Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino, p. 1, 27 mar. 2020. Disponível em: https://www.rededorsaoluiz.com.br/instituto/idor/novidades/como-esta-o-continente-africano-nesta-pandemia-da-covid-19. Acesso em: 9 jun. 2021.
MUSVANHIRI, Privilege. Economia do Zimbabué de novo à beira do colapso: População teme que situação possa chegar aos níveis de 2008/2009 e já compara as filas atuais dos postos de gasolina às desses anos. A escassez de moeda estrangeira continua a ser o principal problema do país. Deutsche Welle, 13 out. 2018. Internacional, p. 1. Disponível em: https://p.dw.com/p/36Uls. Acesso em: 9 jun. 2021.
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ZIMBÁBUE: Sistema de saúde está exaurido pela onda mais recente de COVID-19: A previsão é que os casos continuem a aumentar e as vacinas só devem chegar ao país em quantidade significativa no fim do ano. Médicos Sem Fronteiras, [S. l.], 24 fev. 2021. Atualidades, p. 1. Disponível em: https://www.msf.org.br/noticias/zimbabue-sistema-de-saude-esta-exaurido-pela-onda-mais-recente-de-covid-19. Acesso em: 10 jun. 2021.